Eleanor Friedberger - ZdB


Se no final do concerto de Eleanor Friedberger perguntassem a todos os presentes qual a sua opinião, a resposta seria unânime: foi uma noite “daquelas”. Ainda o concerto não tinha começado e a noite já prometia ser quente! Enquanto aguardávamos pelo seu início no exterior do aquário da Zé dos Bois, numa vã tentativa de encontrar uma brisa na noite quente, sentia-se o bater dos saltos das botas de cowboy de Eleanor (a sua imagem de marca) a passearam-se entre nós em tom provocador, a fazer subir ainda mais a temperatura.

O concerto começa com ‘My Mistakes’, num registo mais rock n’ roll e menos pop, a pautar aquilo que seria o resto da noite: um concerto dividido entre o fantástico LAST SUMMER, primeiro álbum a solo, e muitas músicas novas a prometerem álbum novo. E há que elogiar a capacidade criativa da Eleanor Friedberger, que compõe músicas (e boas) como quem muda de roupa.

Ao vivo, Eleanor apresenta-se acompanhada de banda, o que se traduz num acréscimo de intensidade. Se em álbum sobressai a qualidade de produção, as cuidadas instrumentações e as subtis layers de instrumentos que se vão acoplando uns aos outros, em palco as músicas despem-se até ao seu âmago. São as guitarras, a electricidade, a tomar conta das operações numa mistura de intenções claras. Eleanor ainda é uma menina mas vai segura. Os ingénuos somos nós, quem a ouve, os que se deixam iludir pela delicadeza que não é mais do que puro charme, que logo nos conquista e nos deixa embasbacados.
E, infelizmente, o fim aproxima-se depressa de mais. No regresso para o encore, Eleanor surge sozinha em palco. Amplificadores desligados, apenas a sua voz, grave na medida certa. Certamente já todos partilhámos a sensação de sermos a única pessoa do público, de sermos aquele ponto onde a atenção de quem está em cima do palco, mesmo que só por um breve instante, está completamente focada. Pois Eleanor Friedberger provou, mesmo a solo, que é suficientemente forte para nos encarar de frente sem nunca deixar de nos provocar na mesma música em que nos confronta num olhar: «I wish it was just the three of us again, I wish it was just you, me and her» (parte da letra da música ‘One-Month Marathon’). Um jogo de toca-e-foge em que a cantora nos eleva ao seu imaginário, aos seus lugares (muitas das suas músicas referem-se e têm nomes de locais), às suas histórias que se articulam em versos que encaixam acordes poucos prováveis numa voz que assegura uma história de coisas tão simples e palpáveis como avenidas, armários, espelhos ou inspiradores azulejos do século XIX (portugueses, de preferência, confessou-nos a cantora).

Não há como negar que o quente de Eleanor vem num murmurinho aparentemente desajeitado, numa guitarra só sua e quase despida de artifícios, com as suas histórias que, no fundo, podiam ser as nossas, que, no fundo, nos prometem a música que se esconde atrás de um riso leve mas maduro, o riso da menina a pôr-se em bicos de pé, a querer mostrar-se mulher!

Fotografia: Luís Martins

Texto publicado na Revista Magnética.

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